Acordar. Vestir-se. Tomar café da manhã. Ir à escola. Ver os colegas. Assistir às aulas (recreio, lanche, muita conversa). Voltar para casa. Almoçar. Fazer academia. Estudar. (Sessão de cinema com os amigos). Por fim, dormir. Essa era minha vida antes da pandemia do Coronavírus. Engraçado como, num piscar de olhos, encontramo-nos de cabeça para baixo. O mundo deixou de ser o que era. Não vou mais à escola; assisto às aulas em casa. Não frequento mais a academia; faço exercícios em casa. Não saio mais com meus amigos; encontro-os por videochamadas – de novo, em casa. Esta é minha vida agora. Por mais que Darwin afirme que é preciso se adaptar para sobrevier, como podemos aceitar uma realidade tão irreconhecível?
Admitamos: quando a quarentena começou, achamos que seria apenas por um mês. Agimos como se estivéssemos de férias. Assistíamos às aulas pela manhã e à televisão pela tarde. Chegou a época das provas e ainda estávamos no ensino a distância. Preocuparmo-nos por quê? Não tinha dia específico para realizar os exames. Ou tempo para finalizá-los. Passaram-se as provas, o isolamento, não. Percebi, então, que havia grandes chances de nada voltar ao normal tão cedo: não voltaríamos ao colégio, não sairíamos com os amigos, não teríamos mais o contato físico com os de fora de nossa residência. Ficaríamos assim – em casa. Grande balde de água fria nesse inverno gaúcho. Mas isso significa que o ano está perdido? Que ele será horrível? Que viveremos entediados e nada de bom acontecerá? Não. Não. Não.
Nesse percurso, uma máxima encontrou-me. Logo floresceram dentes de leão em minha mente. Quando passou por mim, revelou-se: “primeiro a gente escolhe o que quer; depois acha o caminho”. Entendi que eu precisava decidir o que queria para o meu ano. Para a minha vida. Sentei e escrevi meus sonhos em um caderno. Enxergá-los tornou-os mais verossímeis. Assim, passei a agir com propósito em vez de apenas existir. Cursos de culinária. De autoconhecimento. De idiomas. De habilidades. Desenevoei meus pensamento com corridas diárias. Li livros. Devorei seriados. Enfim, fiz-me feliz. Muitas vezes um imprevisto nos impossibilita de conquistar algo que queremos da maneira como planejávamos. Mas então surge aquela palavra mágica de Darwin: “adaptar-se”. O objeto de desejo ainda está lá. Resta-nos achar outro caminho.
Será que estarmos de cabeça para baixo não pode ser bom também? Acordar um pouquinho mais tarde. Flexibilizar o horário das aulas. Criar novos hobbies. Inscrever-se em cursos na internet. Desenvolver uma habilidade. Cozinhar uma comida especial. Passar mais tempo com a família. Deixei de ver o lado negativo para me atentar ao positivo. Descobri que a verdadeira felicidade é estar de bem comigo e fazer aquilo que amo. Em isolamento social, pode não ser fácil, afinal, nossa realidade está irreconhecível. Minha perspectiva somente foi alterada quando as penugens do globo dos dentes de leões voaram (sensação parecida a estourar plástico bolha). Eu quase gosto desse “novo normal”. Quem diria?
Texto produzido pela aluna Luisa Berté Hilário, da 3ª Série do Ensino Médio – Turma 302