O momento que estamos vivendo tem exigido das famílias uma grande capacidade de adaptação. A permanência prolongada em casa, a alteração na rotina e a restrição aos espaços ao ar livre impactam a vida de todos, e em especial a das crianças. Para elas, o brincar livre e com espontaneidade é fundamental para o desenvolvimento do imaginário e da criatividade, além de promover a autonomia. Em tempos de isolamento social, de múltiplas demandas, é importante flexibilizar algumas regras, adaptar as brincadeiras, lembrando que o momento está, também, favorecendo a convivência.

De acordo com a Orientadora Educacional da Educação Infantil do Colégio Anchieta, Rosanita Moschini Vargas, estabelecer um diálogo com respeito e acolhimento é uma alternativa para manter a conexão com as crianças e engajá-las no cotidiano. “Explicar a rotina de trabalho do adulto, os momentos de estarem juntos e os momentos em que é necessário distanciar-se, estabelecendo fronteiras, é saudável e necessário. Sempre, independentemente deste período que estamos vivenciando”, destaca.

Embora as famílias tenham assumido outras tarefas domésticas em paralelo às profissionais, o isolamento social tem oferecido a oportunidade para os pais estarem mais próximos física e emocionalmente dos filhos. “Isso oportuniza alguns momentos mais prazerosos e outros mais desafiadores, que exigirão do adulto uma postura mais firme em relação ao comportamento da criança, sem deixar de ser amoroso e acolhedor”, observa a orientadora educacional.

Mantenha a rotina

Firmar uma rotina, por mais flexível que seja, é importante. É ela que possibilita à criança o desenvolvimento da noção de tempo e, ainda, o sentimento de segurança. Trata-se de um fator organizador para a criança e para a família. Há momentos que poderão ser negociáveis e outros, não. “Tudo vai depender do valor que cada família dá para determinado momento. Por exemplo: se fazer as refeições juntos, sentados à mesa, é negociável, ok. Mas, se para os valores da família é imprescindível este momento, então se mantém. É comum perguntar às famílias: o que para vocês é negociável e o que não é? Está aí uma interessante pista para se saber o que se flexibilizar”, esclarece Rosanita.

Brincar é importante para o desenvolvimento

A orientadora lembra que brincar é um direito da criança. “É fundamental por possibilitar que a criança se coloque como protagonista de seu próprio desenvolvimento. É por meio do brincar que ela amplia a sua leitura de mundo, seus repertórios, o vocabulário, desenvolve habilidades sociais, reconhece e identifica as suas emoções, explora sentimentos, valores e aprende a lidar com o estresse”, explica. Além disso, favorece a ressignificação do tempo, ensina a ter tempo, abrindo o espaço de potência, admiração e contemplação, no tempo da infância.

Mas como manter a rotina de brincadeiras diante da recomendação de que é mais seguro ficar dentro de casa? A orientadora lembra que o brincar é livre e criativo. Por isso, há excelentes recursos ao alcance de todos. “Blocos, palitos, balões, rolhas, barbantes, botões, retalhos: são objetos que podem se transformar em infinitas representações. Oportunizam a espontaneidade, o criar, o recriar, o imitar, o pensar, além de favorecer o desenvolvimento de aspectos físicos, motores, cognitivos e socioemocionais”, destaca a orientadora. É importante evitar brincadeiras que promovam risco à integridade física e tomar cuidado com objetos e móveis para que ninguém se machuque. “Há riscos inerentes às brincadeiras, e esses fazem parte do desenvolvimento”.

E quando o tédio aparecer?

O tédio é próprio da vida. E senti-lo pode ser a mola propulsora para a criatividade. “É justamente em momentos de pausa e de falta que o espaço do desejo e do pensar criativo se manifestam. No contexto atual, está aí uma excelente oportunidade para se utilizar dos recursos tecnológicos, com propósito, intencionalidade e sentido, promovendo a manutenção dos vínculos”.

Falando em recursos tecnológicos, o uso prolongado de telas é prejudicial às crianças (e, também, aos adultos), por favorecer a distração passiva. E Isso é muito diferente do brincar – ativo, criativo, potente, livre e despretensioso. Conforme Rosanita, utilizar esse recurso como única forma de entretenimento pode ser prejudicial à criança. “O uso precoce, excessivo e prolongado de telas é um dos principais causadores do sedentarismo infantil, transtornos do sono e de aprendizagem”, exemplifica. A Sociedade Brasileira de Pediatria, em manual publicado no final do ano passado, indica que crianças com menos de dois anos não sejam expostas as telas. E que crianças de dois até cinco anos tenham acesso até uma hora por dia. Para acessar o material, clique aqui.

Para dar fim à saudade dos amigos

Fazer uma chamada de vídeo com os amigos, coleguinhas da escola é uma excelente alternativa. Com a popularização de aplicativos de videoconferência, agendar um encontro virtual também pode ser possível. Mas sempre com o olhar atento de um adulto, que deve acompanhar. Para Rosanita, o atual contexto é uma oportunidade para vivermos e reconhecermos que o uso das tecnologias pode estar a favor do humano. “Nada supera o valor de um abraço, da troca de olhar, do colo repleto de amorosidade e afeto, da interação que o brincar e o estar com o outro favorecem. E isso só a presença propicia”, afirma.

No Colégio Anchieta, desde o início da suspensão das aulas presenciais, a manutenção dos vínculos e a garantia do brincar vêm sendo foco de atenção. Por meio de propostas diversificadas, o brincar, a experiência, a interação, a observação, as transformações são favorecidos, promovendo possibilidades para o protagonismo infantil. “O mesmo se dá nas aulas síncronas. A interação e a ludicidade, o espaço de escuta e acolhimento vem sendo priorizado, com intencionalidade, compreendendo a criança como alguém com direito ao brincar, à aprendizagem e à educação”, destaca Rosanita.

Papel dos pais

            Para o adulto que acompanha a criança, cabe a importante tarefa de tornar efetivas as possibilidades, como facilitadores e observadores, estimulando, por meio do brincar, narrativas, expressões e sentimentos. É aconselhado não interferir no processo, a não ser que seja solicitado pela criança, com um pedido de ajuda, uma orientação ou um auxílio, buscando não modificar a ideia e a organização estabelecida por ela. “O brincar é uma maneira que a criança encontra para expressar sua compreensão do que está em seu entorno, para os tempos atuais. Por isso, nada mais indicado para ocupar o tempo das crianças do que oportunizar o brincar”, finaliza a orientadora educacional.

Dicas para tornar o momento da brincadeira mais interessante

            As brincadeiras direcionadas podem ser adaptadas de diversas maneiras. Confira abaixo sugestões para crianças da Educação Infantil, com idades entre três e cinco anos:

– A bola que seria usada em jogo na rua pode ser substituída pela “bola de meia”, para brincadeira dentro de casa.

– Garrafas plásticas podem se tornar obstáculos a serem superados.

– Use o tapete ou o colchão para promover cambalhotas e estripulias.

– Use fita adesiva para criar obstáculos. Cole de uma parede a outra, fazendo zigue-zague, e convide a criança para ultrapassar e pegar objetos

– Guarde brinquedos em locais secretos e promova uma caça ao tesouro.

– Tem uma floreira em casa? Os pequenos vão adorar transformá-la num pequeno jardim a ser cultivado por eles com o auxílio da família.

– As músicas podem auxiliar na brincadeira de estátua. As crianças adoram também brincadeiras como “morto-vivo”.

– Bolinhas de sabão, construções, cabanas e tendas, teatro de fantoches, massinha de modelar, jogos de tabuleiro, brincadeiras ritmadas, cantigas infantis são outras opções.

– Brincar é atemporal. Resgatar brincadeiras do tempo em que os pais eram crianças e partilhá-las com os filhos é, também, uma oportunidade de fortalecer vínculos, ressignificar histórias e cultivar memórias.

– Lembre-se: quando se trata de brincar, em que a fantasia e a imaginação são potências, não há limite.

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Fonte: Professora Rosanita Moschini Vargas, Orientadora Educacional da Educação Infantil do Colégio Anchieta